quarta-feira, 28 de novembro de 2012

,escrevo contra o que me lembro



,vã,

(I)

visão de alguns anjos coxos que gravitam
em elípticas,
escondem pés, pernas, coxas,

bando de morcegos albinos rodeando figueiras
adormecidas, sem fruto,
vãs,

e no alumbrar ao longe regressam algumas cores,
sejam alucinações psicadélicas,
sejam alucinações, sós, sóis

,insepultos.

,escrevo contra o que me lembro
senti-lo-ei sempre hoje, senti-lo-ia como ontem,

podê-lo-ei sempre sentir amanhã,
qual grito, quão perto do silêncio absoluto,

vão.

,empederniram-se estas veias,
mais cedo lavas, sim, apenas respiro,

sem ânsia, a morfina toma conta do corpo,

e o mar tão perto que lhe toco ao de leve,
despenteio-o.

[contra o que me lembro, escrevo fragmentos].

(II)

, “- mira, já ali as tâmaras, a água, as náiades, mira gajeiro, já aqui!”




Textos de Francisco Duarte

,disfarçam-se alguns outros



(I)

,é na orla que se escondem os corpos,
simples,

e as fuligens que restam, tão longe,
amontoam-se em pântanos,
apavoram-nos

esses interiores escuros, fingidos, frágeis,
finge-se.

,disfarçam-se alguns outros.

(II)

,tem vezes que anseio noite,
como fuga, arrojo exausto
símil à travessia gasta, desgastante o dia,

e quando as palavras, se destecem ponto por ponto,

perdidas como o vinho vomitado, inquieto-me.

, inquieta-me o odor do jasmim que se liberta
além

,além do mar.

,despontam pétalas que se espalham, invadem
as tardes de outono acastanhadas,

aquém-terra,

e já ali, mergulho, por este mar acima,
sem destino, sem pressa,
simples,

singro-me,

ou esqueço-me.

(III)

[a quem importa, se nem a mim?]





Textos de Francisco Duarte

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

,as garrafas de gim vazias



seja-me procura a ida, a vinda,

quando olho pela janela gradeada, medrosa,
como se tudo fosse perigo,

assalta-me a nostalgia da liberdade,
tudo novidade lá fora, já aqui,

, e as mãos tateiam horizontes,
ocasos, hecatombes que se perfilam,

porque não?,

repete-se beirute, gaza, dar es salaam,

repete-se o outro que se liberta deixando o
cordão umbilical estático, constante,
repetindo-me, distorcendo-me.

(I)

os lírios voam sem destino,
nunca serão aves migrantes,

, resistem ainda ecos, destroços,

enquanto os corpos se reconstroem,
e habita-me o cansaço,
o som do piano num bar de terceira, algures ,
as garrafas de gim vazias,
[sempre vazias...]

fitam-me olhares vazios,
e palavras,

e mais palavras que não entendo.

(II)

,sejam-me procuras, porra,

,sejam-me só idas,
sem porras de regressos, sem fragmentos.




Textos de Francisco Duarte

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

,que me interessa se é noite ou dia



,que me interessa se é noite
ou dia,

se Tatum quase cego tocava melhor que
Walter Gieseking,

de que me interessam as fotos pregadas
num quadro de corticite, Vladimir Ilitch lendo
o Pravda, um mapa mundo retangular
a cores,

se Maiakóvski está a preto e branco,

de que me interessam o Che, os camaradas
da tropa segurando a G3 no meio do mato
em angola, e os sorrisos parvos do medo,

de que me interessa a morte,
se o conhaque já está no fim,
e o cinzeiro carrega pontas de cigarros,
alguns ainda sobrevivem, fumegam,

que me interessa se é desirré, zirrê, criptonita,
ou a puta que o pariu,

enquanto o fumo invade o espaço
dos livros por todos os lados,
empilhados como a torre de Pizza
prestes a caírem,

de que me interessa se é preste joão,
ou prêtre, ou padre João da Etiópia, descendente de
Baltasar, ou dos cavalos apocalípticos,

se a foto do cendrado mar me adentra
pela visão, turvada, curvada,

de que me interessam o bafio do amar,
do beijo, das putas sentadas de pernas
abertas exalando perfumes baratos,
procurando uma noite paga,

se as promessas se repetem, e repetem,
sem cor, viciadas como as cartas
em cima de um pano verde doentio,

de que me interessam o verso, o poeta,
o escarro que piso na calçada,
ou o sangue que escorre do inocente,
ou do bandido com o ferro na mão,

se deixaram de respirar, de ouvir, de ver,

,que me interessa se é noite
ou dia,

se por hoje, quero, silenciar-me!!?

[,de que me interessam as exclamações a interrogação se resistem].

[,de que me interessa reler o que escrevi, corrigir, na verdade vos digo, nada].






Textos de Francisco Duarte



segunda-feira, 19 de novembro de 2012

,federá sempre



(I)

trégua?

, em tantas ocasiões o sacrifício resvala,
quão inerte sarcasmo,
quão breve vaga,
longo dia, ou noite, desmemoriados
 intemporalmente

pelo breve ondear do mar,
que ondeia como os amantes se beijam,

serpenteiam.

(II)

sem trégua?

,renunciou a virgem ao dar uma palmada no menino?
sacrificou-o?

fala-me do desconhecido, do ocaso
onde mar e terra fogem a ambos sem sacrifícios,



desconstrói os corpos. Os fragmentos que fiquem a boiar
no lamaçal.

,federá sempre.




quinta-feira, 15 de novembro de 2012

,e se o tempo parar



(III)

destrói a linguagem,
os epítetos, destrói o cinturão de afrodite,

destrói o verso,
...
que as imagens fiquem fixas, imóveis, isoladas,
e se o tempo parar,
se os rios (então) nascerem do salso mar bravio ou do estagnado pântano,
que tudo seja engolido pelo ocaso,

libertação, ou liberdade que importa, mas que seja.

(II)

como o raio.

tudo muda, até recordações, obsessões, até criações,

transformam-se, transtorna-me o dia assim sonso,
gemido calado, silêncio desflorido de outono,

expeço-o com a rouquidão do pedinte,

destruí-lo-ei pela noite,

(I)

acordo-me da vã visão do nefasto.







[aleatório o devaneio]
grito-me.




Textos de Francisco Duarte


segunda-feira, 5 de novembro de 2012

,com que outros incham




nada me surpreende, nem o adeus.


nem o trágico lenço branco ao vento,
muito menos o beijo descolorado, respirado,

esperado,
nem a tentativa de expiação desejada, ajoelhada,
nem a culpa,

foi-se, que se encontre por aí perdido, nenhures.

Destas coisas da vida, restam os restos
com que outros sobrevivem,

com que outros incham,
rebentarão,
(sem implodir)

também.

Aqui e ali fica o vazio, logo ocupado,
e as palavras definham,
estranham-se,

dir-se-ão injustas
querer-se-ão justas jamais,

refugiar-se-ão por cantos esconsos fedendo,
e deixarão a vida como o tédio,

já nada me surpreende,

nem o esvaziamento, nem o nada,
nem o porra para isto tudo.

(findo, ou fim, tanto se me dá)