quarta-feira, 27 de março de 2013

,sangro-me inutilmente



,saberás de mim [?], sim, sempre.

(I)

desenraízo-me por vezes do mar pela primavera,
diz-se de cruel esse mar,
deixo pela superfície ainda em espuma

urros antes afogados, hibernações
que me acordam pelas matinas em aparição
refletida por algumas sombras, alguém,
ninguém,
não questiono sequer,

enquanto me desfaço por entre escarpas que me ferem,
que me incomodam a carne, sangro-me inutilmente.

(II)

,talvez me vogue por entre nuvens sem ventanias,
ou nas searas queimadas pelo gelo,
em círculos,
esperas

sem o odor das madressilvas onde as andorinhas se escondem,

descanso na nudez do teu ventre, somente um prelúdio,
nada mais.

(III)

,a claridade desaparece, de repente revejo-me lá longe,
onde nevoeiros acirrados me cercam por todos os lados,

,sem suspiro, ou credo, despojado de claridades,
tentando libertar-me das garras cravadas nas costas,

desta afonia ridícula, repetida,

,repete-me a pétala que esvoaça pela noite.
[afoga-me esta noite, santifica-me a emoção]










Textos de Francisco Duarte

segunda-feira, 18 de março de 2013

,sem sementes de papoulas nas mãos



,nascem pelo poente as cerejeiras despidas,
rejuvenesça-se a cor,
e o vento sopra de longe, escapa-se assim,

por entre os dedos sem vestígios.

(I)

,veste-te nesses gestos tão repetidos,
afinal, chove breve,
por um instante pensei nos sonhos despedidos,

partidos, rasgados pelas noites escuras,
sem sementes de papoulas nas mãos,
escuridões intempestivas,

haja boca que resista ao trago rápido do vinho.

,algumas vezes deixo-me morrer sem os cheiros
conhecidos pelas tardes que antecedem o crepúsculo,
por vezes sei das ausências surdas, símiles
aos pássaros em bandos escurecendo céus,

enquanto trompetas atordoam ecos que se revoltam,
entrincheirando palavras há tanto hibernadas, cacofônicas.

(II)

,sabes, quisera um dia salvações inúteis,
pela estrada que começou lá atrás, sem curvas,
vontades, um fim,

e levitei-te, e inventei-te,
quisera apenas caminhar os teus caminhos,

olha as margens, por onde a rouquidão repete os triviais
passos em volta.

,volto-me, sim.

(III)

,[regresso-me, rasga-me em silêncio].






Textos de Francisco Duarte

domingo, 17 de março de 2013

,a cada véspera



,exaspera-se a vã preguiça acossada pelos olhares escondidos
que se escapam.

(I)

,a cada véspera, sem esperas,
sem ondulações distantes,

ficam vestígios das mãos, [um dia, talvez] entrelaçadas.

,vê-se o rasgar das cortinas, destapando janelas fechadas,
enquanto tapo a tua nudez,

querendo-me dono do tempo sem espaço,
das matinas recordadas sem vestígios,

das garrafas vazias, sentindo a azia escondida,
querendo mais, sim, a cada dia, sem fim.

(II)

,tudo se repete, o grito que estrebucha
das palavras gastas, castas,
rendições sôfregas,

pelas sombras que anoitecem a cada dia.

(III)

,[porque não anoitecer-me mais esta vez?],
que seja!








Textos de Francisco Duarte